segunda-feira, 26 de março de 2018

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II Seminário de Jornalismo Cultural: Apostar na reflexão para construir cidadãos críticos
A FORMA como as matérias sobre as artes e cultura são reportadas na media foi a temática dominante na abertura, ontem, do II Seminário de Jornalismo Cultural, a decorrer até amanhã no Camões – Centro Cultural Português, em Maputo.
Sob o lema “Cultura e Arte como Factores de Desenvolvimento”, os oradores fizeram intervenções que estimulam a inclusão da crítica, destacando o editoriasparticipação activa dos que lidam com estas matérias, daí terem sido convidados académicos, gestores culturais, fazedores das artes, entre outras personalidades.
Alexandra Pinho, directora do Camões – Centro Cultural Português, considerou que o jornalismo cultural não pode ser meramente noticioso, mas deve ser desafiador, “provocante” e que se posiciona de forma diferente de outras abordagens jornalísticas.
O embaixador da União Europeia em Moçambique, Sven Von Burgsdorff, frisou que o seminário tem o condão de permitir que se discuta a empregabilidade, na indústria cultural, de uma massa crítica que tem tendência de ir ao emprego rural e informal.

Preservar identidades
O jornalismo cultural tem de explorar questões relacionadas com a identidade e não se limitar às artes, defenderam os oradores do painel inaugural, cujo tema era “Media e Cultura: Caminhos para Desenvolvimento e maior Cidadania”.
Sob moderação do académico Aurélio Ginja, esta mesa foi composta pelo jornalista e director do “Notícias”, Júlio Manjate; jornalista e cineasta espanhola Lúcia Rubio; e o coordenador do Centro de Apoio à Informação e Comunicação Comunitária (CAICC), Lázaro Bamo.
“Precisamos encontrar outras dimensões do jornalismo cultural, em discussões sobre os nossos usos e costumes tradicionais como a circuncisão masculina e a prática do ‘kutchinga’, por exemplo”, sugere Júlio Manjate, depois de defender que as artes não podem ser uma zona de conforto do articulista.
O director editorial do “Notícias” entende que esta poderia ser uma das formas de evitar choques culturais a que os jovens acabam submetidos pela sua ignorância em relação a esses assuntos.
Com recurso a métodos e rigor jornalísticos, prosseguiu, a media pode ajudar a perceber esses fenómenos, contribuindo, desta forma, para a transmissão do legado histórico às novas gerações.
Da Espanha, Lúcia Rubio trouxe a experiência do trabalho que desenvolve em torno da representação dos afro-descendentes na media deste país europeu.
Conforme explicou, a forma como a comunidade negra aparece nos meios de comunicação era, até há alguns anos, repleta de estereótipos, como, por exemplo, a ilustração da figura do homem semelhante ao selvagem Tarzan (personagem de ficção criado pelo escritor norte-americano Edgar Rice Burroughs). De igual modo, referiu que as mulheres eram representadas como objectos meramente sexuais.
A jornalista contou que a construção de uma imagem redutora da raça negra na Espanha se estende à forma como se reporta África, em que as imagens exploram somente as áreas rurais, dando, desta forma, a perceber que a urbanização ainda constitui uma miragem no continente.
Por sua vez, Lázaro Bamo partilhou o que tem visto pelo país, trabalhando no CAICC, tendo sido nesse quadro que percebeu o potencial de um jornalismo cultural regional que se dedicaria a divulgar as actividades das comunidades.
Esta instituição está conectada a 135 estações de rádio comunitária em todo o país, cujo raio de audiência atinge cerca de 18 milhões de moçambicanos. Disse que essas estações e detêm um enorme potencial para divulgar novos talentos.
Reconhecendo tratar-se de um jornalismo apenas de anúncio de eventos, Bamo partilhou que as rádios comunitárias começam a ter acções inovadoras, dando exemplo dos distritos de Inharrime, onde a rádio reproduz contos tradicionais, e Massinga, em que transmite músicas gravadas nos seus próprios estúdios.
Aprofundar abordagens
Inaugurando as apresentações do painel que discutiu o tema “Conteúdos de arte na media: estética vs juízo”, a cantora e escritora Melita Matsinhe diz observar que a maior parte das notícias que passam nos órgãos de informação resulta da reprodução de comunicados de imprensa.
E questionou se essa forma de trabalhar constituiria motivo de orgulho, uma vez ser simplista e reduzir a acção do próprio artista.
Reconheceu, no entanto, que ao longo dos cinco anos da sua vida artística sempre teve cobertura jornalística.
O músico MC Roger (Rogério Dinis) falou da sua experiência na cultura, que começa como apresentador de programas musicais na TVM e na RTP África. E já como músico diz ter gravado 10 álbuns em 10 anos, tendo sido ainda um dos precursores do Dance Music.
Anota que os artistas, particularmente os músicos, estão a perder a sua identidade, que, a seu ver, se não está evidenciada no som ou na imagem, deve estar presente na mensagem veiculada. Reconheceu ter sido bem e mal tratado por certa media, assinalando ter havido jornais que tentaram “assassinar” o seu carácter, ao publicar notícias jocosas a seu respeito.
Rogério Dinis apelou, por isso, para que haja uma relação cordial e de respeito mútuo entre os jornalistas e as fontes de informação.
Já Eduardo Constantino, secretário-geral do Sindicato Nacional de Jornalistas (SNJ), defendeu a especialização dos jornalistas culturais, mesmo estando certo de que nas academias não se especializam profissionais de comunicação social, mas sim faz-se uma formação generalista, o que exige que o jornalista se capacite para melhor abordar os assuntos.
Chamou atenção para que não se imputem ao jornalista cultural responsabilidades que são de outros fóruns de abordagem, como por exemplo a crítica e o ensaio que, a seu ver, devem ser feitas por gente especializada, assumindo, porém, que a área mexe com o sentimento profundo do articulista.

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